Centro Educacional Reeducar

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sexta-feira, 14 de junho de 2013

AS MAIORES DÚVIDAS SOBRE PSICOTERAPIA

AS MAIORES DÚVIDAS SOBRE PSICOTERAPIA

A psicoterapia é um método terapêutico que visa tratar os transtornos psicológicos por meio da reaprendizagem de comportamentos e mudança de crenças e significados. 

Neste artigo vamos abordar as seguintes questões sobre psicoterapia:

- As diferenças entre: tratamento psiquiátrico e tratamento psicoterápico.
- As suas respectivas indicações terapêuticas.
- Os limites e preconceitos contra a psicoterapia
- As principais modalidades da psicoterapia e suas características.

Uma das dúvidas mais frequentes de quem procura tratamento para problemas psicológicos é, inicialmente, entender as diferenças entre o tratamento psiquiátrico e o tratamento psicológico. A maioria talvez nem saiba que existem essas diferenças e confundem médicos psiquiatras com os psicólogos clínicos, e psicólogos com psicoterapeutas.  Portanto, vejamos o que faz cada um:

TRATAMENTO PSIQUIÁTRICO:

É realizado por um médico com especialidade em psiquiatria. Este tratamento é o mais conhecido por ser ofertado na lista de tratamentos dos planos de saúde. Como a psiquiatria é uma especialidade médica e a base da medicina é o organismo e o seu funcionamento bioquímico, o tratamento psiquiátrico é realizado por meio de terapia medicamentosa. São usados os famosos remédios para depressão, ansiedade, impotência sexual e déficit de atenção, entre outros, que prometem agir sobre receptores químicos específicos do cérebro,  aliviar os sintomas e controlar as crises.

TRATAMENTO PSICOTERÁPICO:

Enquanto a psiquiatria visa gerar uma mudança comportamental com o uso de drogas específicas, a psicoterapia se concentra nos processos de aprendizagem que são resultado da interação do indivíduo com o meio social. São essas diferenças que tornam o convívio entre as pessoas e a sua cultura tão importante para o equilíbrio de saúde mental. Há vários estudos que indicam uma correlação entre momentos de depressão econômica e aumento de suicídios e de doenças mentais.
Portanto, a psicoterapia parte do princípio que os transtornos mentais são resultado de processos de adaptação e de aprendizagem. O entendimento da função do comportamento problemático, e de como ele foi construído, no contexto de vida de cada paciente, fornecerá os dados necessários para a ajudar na modificação das respostas mal adaptadas.
TRATAMENTO COMBINADO:

Embora nem todos os transtornos mentais tenham indicação para o uso de medicamento psiquiátrico, nos casos mais graves de psicose, como a esquizofrenia e o transtorno bipolar, ou na depressão aguda, o uso de medicamento é essencial para controlar as crises e assegurar a estabilidade vida da pessoa.
Por outro lado, se as drogas não são para todos, a psicoterapia é um tratamento sem contra-indicações, quando feita com profissional qualificado. Ela pode ser indicada para todos os casos de psicopatologias, uma vez que seu uso visa identificar as respostas mal adaptadas e ajudar os pacientes a superar as suas limitações, ampliando suas habilidades e o seu repertório de respostas comportamentais, como a melhoria na habilidade de comunicação.
O ideal é que todos os tratamentos psiquiátricos, farmacológicos, fossem obrigatoriamente acompanhados de tratamento psicoterápico, mas, infelizmente, é comum alguns médicos não darem a devida importância ao tratamento psicoterápico, mesmo tal fato seja contrário ao que diz a maioria das pesquisas clínicas.
A psicoterapia pode ser exercida por médicos psiquiatras, embora a maioria deles tenha formação apenas farmacológica, já que é a visão dominante na medicina. É mais comumente usada pelo psicólogo, sendo sua principal ferramenta de intervenção clínica, e por profissionais que largaram suas profissões originais para se dedicar ao trabalho de psicoterapeuta, realizando cursos livres e formações não acadêmicas.

OS LIMITES E PRECONCEITOS CONTRA A PSICOTERAPIA
Uma das maiores causas dos preconceitos e restrições de médicos e pacientes ao tratamento psicoterápico, diz respeito ao dilema: eficácia – tempo de tratamento e formação profissional. Vamos entender cada um deles:
FORMAÇÃO PROFISSIONAL

A psiquiatria envolve a prescrição de medicamentos controlados, e isso só pode ser feito por médicos psiquiatras. A psicoterapia também já foi restrita aos médicos, mas depois se ampliou para a psicologia clínica, devendo boa parte da evolução às pesquisas psicológicas.

No entanto, fora da área da medicina e da psicologia, a psicoterapia não tem qualquer regulamentação, o que a torna uma prática irrestrita e sujeita ao mercado, onde qualquer pessoa pode se intitular psicoterapeuta e prestar tais serviços.
Comparativo entre tratamento falso (placebo), tratamento farmacológico (antidepressivo) e psicoterapia

EFICÁCIA

Só se pode conhecer a eficácia de um tratamento quando ele é sujeito a pesquisas com grandes populações, algo em torno de 5 a 10mil pessoas, quanto menor o grupo pesquisado, maiores são as chances de erros. Por isso, apenas poucas modalidades de psicoterapias foram pesquisadas, justamente, aquelas que surgiram como fruto de pesquisas médicas ou psicológicas. Dentre as modalidades mais pesquisadas que acumulam evidência de sua eficácia, podemos destacar: 1) terapias cognitivo-comportamentais e; 2) hipnose clínica; e as 3) As terapias humanistas e psicanalistas que também apresentam dados favoráveis, mas com tempo de resposta bem mais demorado, o que diminui a confiabilidade das pesquisas. Mas todas são superiores quando comparadas a grupos não tratados.
TEMPO DE TRATAMENTO

O tempo de tratamento depende de alguns aspectos essenciais:
a) o tipo de problema apresentado;
b) o tempo de início do transtorno;
c) o histórico de vida do paciente;
d) a sua condição atual e relação de apoio social e familiar; e, por fim,
e) o tipo de terapia escolhida.
Dependendo do tipo de limitação apresentada. Quando mais cedo o paciente buscar ajuda, mais rápido será o tratamento, quanto mais tardio, mais demorado.
MODALIDADES DE PSICOTERAPIA:

Certamente deve existir mais modalidade de psicoterapia do que eu mesmo conheço, por isso, o critério “quantidade” não será levado em conta nesta análise, mas sim, o quesito “qualidade”. O motivo da existência de diversas modalidades de psicoterapia é que qualquer tipo de prática que, aparentemente, conduza a modificação do comportamento pode ser chamada, pelo seu criador, de “psicoterapia”, e ser vendida como tal. Até mesmo as terapias religiosas que estabelecem padrões rigorosos de conduta são, às vezes, chamadas de psicoterapia.

Nesses casos, não há preocupação em se realizar estudos rigorosos e com grandes populações para verificar a eficácia dessas práticas, pois tais procedimentos são preocupações apenas da ciência, e é comum a difusão dessas terapias em meio social religioso ou no senso comum, como é o caso das terapias de regressão a vidas passadas.

Esta falta de controle favorece a proliferação de oportunistas que anunciam curas rápidas de vários problemas e acabam por proliferar o descrédito na psicoterapia. Dentre as psicoterapias citadas a seguir, destacarei apenas aquelas que foram objeto de estudo científico.

AS MODALIEDADE DE PSICOTERAPIA

TERAPIA DE MESMER OU HIPNOSE CLÍNICA

É considerada a mãe de todas as psicoterapias por ter sido o primeiro método de tratamento psicológico usado na medicina. Tal fato aconteceu no século XVIII e causou uma verdadeira reviravolta no ambiente científico. Em 1765, o médico austríaco Anton Mesmer defendia que os médicos deveriam abandonar as suas lâminas de sangria – o tratamento tradicional para quase tudo, na época – e usar a técnica criada por ele, que necessitava apenas de palavras e passes com as mãos.

Muitos dos pacientes hipnotizados pelo Dr. Mesmer vivenciavam um estado de agitação convulsiva, com movimentos involuntários, gritos e liberação de energia, depois, pareciam despertar de um sono restaurador se sentindo bem melhores e alguns até mesmo curados das suas moléstias.
A terapia de Mesmer se transformou numa febre em Paris, sendo usada para tratar a própria Rainha, mas, posteriormente, Dr Mermer foi banido de Paris por uma comissão de pesquisadores e sua técnica só retornaria 100 anos depois, como uma das grandes ferramentas da psicoterapia.

PSICANÁLISE E TERAPIAS ANALÍTICAS

Graças a hipnose, outro médico austríaco, resolveu largar os tradicionais métodos fisiológicos e bioquímicos da medicina tradicional para se dedicar a compreensão da mente humana. Ela se chamava Sigmund Freud e se inspirou na filosofia de Platão e na Mitologia Grega para criar a sua própria versão do funcionamento da mente humana. As suas idéias influenciaram o conhecimento científico e as teorias sociológicas .
Freud criou a umas das primeiras psicoterapias, após Mesmer, que ele deu batizou de Psicanálise. Diferente da maioria das psicoterapias, a psicanálise não tinha o objetivo de tratar diretamente as doenças mentais, mas de gerar autoconhecimento a partir da sua própria versão de como a mente humana funcionava.
Recaí sobre a psicanálise a maior parte do mito sobre a ineficácia da psicoterapia, pois como a psicanálise não é focada no tratamento breve de doenças, nem na lógica focal de tratar o aparente, ela pode ser exercida por alguns anos.

PSICOTERAPIAS FENOMENOLÓGICAS E HUMANISTAS

As terapias humanistas surgiram como uma alternativa a terapia psicanalítica que se alastrou por toda a medicina, muito embora, a psicanálise pudesse também ser aprendida e praticada por não médicos. Diferente da psicanálise que estabelece impulsos primitivos do inconsciente como causas dos comportamentos patológicos, a terapia humanista, como a ACP de Carl Rogers, parte de uma compreensão mais harmoniosa e naturalista do ser humano. Rogers defendia que os seres humanos são naturalmente bons e que a terapia seria um local de acolhimento para que os pacientes pudessem falar dos seus sentimentos mais profundos, sem serem julgados ou punidos. É uma terapia focada na ampla expressão emocional.
TERAPIAS COGNITIVAS COMPORTAMENTAIS

As terapias comportamentais reúnem as psicoterapias com maior comprometimento científico. Elas foram desenvolvidas a partir do estudo do comportamento animal e estudos sobre cognição, aprendizagem e processos de aprendizagem sociais.

Toda a sua base se fundamenta nas relações de como o organismo reage ao ambiente e se modifica para obter adaptação. A sua objetividade e foco nos sintomas, as vezes, pode ser contraproducente, pois alguns sintomas podem despistar as reais causas dos problemas. A sua eficácia é uma das melhores quando comparada as demais terapias  de médio e longo prazos.

RETORNO DA HIPNOSE COMO FERRAMENTA, NÃO COMO PSICOTERAPIA

Embora a hipnose guarde seu valor mítico e seja uma ótima ferramenta para pesquisas psicológicas, tudo o que é conseguido em uma terapia com hipnose, também pode ser conseguido sem hipnose. Não é a hipnose que vai criar o tratamento, ela ajuda o paciente a se concentrar e processar melhorar as lembranças, os sentimentos, e as informações que ele precisa trabalhar para modificar os aspectos disfuncionais do seu comportamento.
As meta-análises estabeleceram que psicoterapias diferentes têm resultados diferentes. Terapias cognitivo-comportamentais são significativamente mais eficaz do que as terapias psicodinâmicas, e sua superioridade aumenta quando longo prazo de acompanhamento é avaliada. A hipnose aumenta a eficácia tanto da psicoterapia psicodinâmica, como das psicoterapias cognitivo-comportamental, e este efeito é especialmente forte em resultados a longo prazo do tratamento para a obesidade (Kirsch, 1996).
Se a prática médica que é guiada por padrões clássicos de estudos baseados em evidências sofre variações de médico para médico, na psicoterapia as diferenças também existem.
Tal fato acaba por indicar que as explicações sobre o comportamento não são tão importantes para o tratamento quanto a prática de falar sobre os próprios conflitos. O que leva muitos a considerar que o simples ato de expor seus problemas a um profissional treinado que não irá julgá-lo, ou induzi-lo a realizar escolhas que não sejam suas, já é por si só, é um dos grandes princípios terapêuticos das psicoterapias.

Fonte: Comportamento.net

INTELIGÊNCIA EMOCIONAL PARA A DIETA FUNCIONAR

Efeito sanfona, boicote à dieta, assalto noturno à geladeira, preguiça de ir à academia. De acordo com o fundador e presidente da Sociedade Brasileira da Inteligência Emocional no Brasil, Rodrigo Fonseca, tudo isso pode ser culpa do inconsciente. “O corpo é o reflexo do que existe dentro da pessoa e essa imagem está atrelada às emoções. As mulheres estão cansadas de saber o que devem ou não comer para não engordar, mas o inconsciente grava emoções que levam a ingerir gordura, mesmo sem querer ou precisar”, explica.

O especialista falou à Marie Claire sobre como essas emoções ficam gravadas no inconsciente e deu dicas para fazer a inteligência emocional trabalhar a favor da perda de peso e do bem-estar definitivos.

MARIE CLAIRE: Como a inteligência emocional pode interferir no processo de emagrecimento?

RODRIGO FONSECA: Gosto de comparar o ser humano com um computador: temos o hardware, que é o nosso corpo, e os softwares, que são os conhecimentos teóricos que adquirimos ao longo da vida na escola, em livros, palestras. Entre o hardware e o software existe uma parte fundamental da máquina e também do ser humano chamada de sistema operacional. É lá que estão gravados nossos programas emocionais, que foram registrados em algum momento da nossa história, num nível inconsciente. Esses programas emitem impulsos que nos fazem comer à noite, mesmo sabendo que o melhor é comer pela manhã; que nos fazem ingerir gordura, doces e etc.


M.C.: Como é formada essa programação emocional gravada no nosso inconsciente?

R.F.: Ela começa a ser registrada desde a gestação até, no máximo, dois anos. Nessa fase, o cérebro é uma esponja e tudo é absorvido. Ali fica gravada toda a estrutura emocional que, mais tarde, geralmente na adolescência, começa a desabrochar. Por isso é comum sentirmos angústia, raiva e outros sentimentos a partir dos 12, 13 anos. É por isso, também, que geralmente nessa fase começamos a engordar.

M.C. O que é preciso fazer para alterar essa programação emocional?

R.F.: Primeiro, tomar consciência de que aqueles quilinhos a mais realmente te atrapalham e fazem mal tanto para a saúde como a vida social. Depois, buscar por meio de terapia, técnicas que acessem o inconsciente e descubram porque há aquela gravação. A partir do momento que o problema é trazido à consciência, o cérebro dará uma nova interpretação e o sentimento será gravado de outra maneira no inconsciente.

M.C.: Por que muitas pessoas começam a emagrecer e, quando estão quase alcançando o objetivo final de perda de peso, abrem mão da dieta?

R.F.: Esse boicote acontece por conta de um efeito chamado sincronismo. Quando o inconsciente detecta que o corpo está diferente do registrado por ele, ou seja, com mais gordura, libera os impulsos que fazem abrir mão da dieta por qualquer motivo, seja o falecimento de um ente querido até uma grande conquista pessoal. Para se ter uma ideia, a velocidade de processamento do nosso racional é de 40 impulsos neurais por segundo. Já o nosso inconsciente processa 40 milhões de impulsos neurais por segundo. Ou seja, na hora que dá o play, a informação que chega primeiro é a de que o corpo precisa de gordura. Por isso que, por mais dietas que se faça, é sempre difícil alcançar o objetivo final e acabar com o efeito sanfona.

M.C.: Quais são, geralmente, os programas emocionais que levam as pessoas a comer exageradamente e engordar?

R.F.: Medo, insegurança, tristeza, angústia. São sentimentos que geram uma necessidade de proteção e o inconsciente entende que, com a ingestão de gordura, o contato com o mundo exterior fica mais mais distante.

Veja cinco dicas de Rodrigo Fonseca para para administrar a inteligência emocional e não engordar mais

RECONHEÇA O MAL QUE A GORDURA FAZ PARA VOCÊ

Não adianta alguém de fora dizer várias vezes que você está acima do peso e precisa emagrecer. Isso soará como se estivessem tentando alterar sua programação e aí o efeito é o contrário: mais gordura para se proteger desse agente externo. Por isso que é importante o próprio reconhecimento da real importância de perder peso para a saúde e para a vida social.

DECIDA MUDAR

Diga “eu vou mudar de verdade” e a partir daí tome decisões que te levem para um processo decisivo e definitivo de emagrecimento.

ANOTE OS PREJUÍZOS ACUMULADOS

Coloque no papel todos os danos que esses quilos a mais trazem para a sua vida. A vergonha do corpo, a roupa que não serve mais, vale tudo mesmo. Isso facilita a visualização dos problemas e impulsiona a mudar a situação.

ANOTE OS GANHOS

Aumento da autoestima, guarda-roupa novo, vida social mais agitada: assim como fez com os prejuízos, anote também os benefícios que terá com a perda de peso.

PROCURE AJUDA

Busque técnicas e terapias que identifiquem o que está causando determinado tipo de comportamento que te faz comer demais e engordar. É preciso mudar de dentro para fora e essa transformação começa a partir do inconsciente.

quarta-feira, 17 de abril de 2013


Do desejo de aprender ao prazer de ensinar: um exercício de autoria de pensamento.

Prof. João Beauclair
Resumo:
Em seu livro "A inteligência aprisionada”, Alicia Fernández nos afirma que a inteligência é construída. No entanto, temos no nosso tempo presente processos de efetivação de diagnósticos que ignoram esta afirmativa e observamos, infelizmente, que na prática pedagógica, metodologias e posturas atitudinais negam espaço para tal construção. Aqui, num exercício de autoria de pensamento, busca-se elaborar provocações ao nossosentipensar sobre o papel do desejo e do prazer no que se refere aos movimentos deaprendências e ensinagens, enfatizando a importância da motivação, da criação de vínculos, do afeto e da amorosidade para promovê-los a posição de protagonistas no cotidiano escolar e na construção da inteligência nos diferentes ambientes que se vinculam em nossa formação. A partir de minhas práticas como educador e pesquisador no campo da Psicopedagogia e da Aprendizagem, abordo tais questões referenciando aspectos plurais da questão, desejoso apenas de organizar alguns pontos de partida com tais provocações sem, no entanto, estar focado em rigores acadêmicos e pleiteando verdades impossíveis. São ideias para se discutir, pontos de vista para se partilhar, enfim, aberturas para que diálogos sejam fomentados.

Palavras chave: Aprendizagem, Psicopedagogia, Desejo, Prazer, Motivação, Vínculos, Afeto e Amorosidade.

Introdução: O que entendo como um exercício de autoria de pensamento?

O conceito de autoria de pensamento integra os referenciais da Psicopedagogia Clínica proposta por Alicia Fernández. Ao longo do tempo, venho ampliando percepções com meus trabalhos psicopedagógicos, fomentando discussões e buscando divulgar tal conceito, aprimorando-o em minhas práticas de docência e de pesquisa. Com o campo de movimentações que se abre a cada um de nós ao estudar e aprender sobre Psicopedagogia, uma questão logo nos é posta: como sair do lugar de alunos, onde sempre estivemos ao longo de nossas formações? Lugar este onde, mesmo com todas as boas vontades de plantão, fomos e ainda somos, em muitos momentos, sujeitos passivos, nem sempre ouvintes atentos, por tantas vezes distraídos com outros temas, coisas outras, latentes em nosso viver.
Territórios do poder? Espaços de reprodução? Ou um tanto imenso de outros nomes que possamos dar a escola em todos os seus níveis de ensino? Acredito que a escola está longe de privilegiar a autoria. Porque tal crença? Para aprender, é preciso ensinar e as fronteiras entre uma coisa e outra é constituição de tênues fios flexíveis quando assim as podemos conceber. Tudo é exercício.
         O que eu vejo só eu vejo, pois não nos é possível ver o que o outro vê. Podemos partilhar ideários, sonhos, utopias, movimentos, mas somos singulares, sujeitos de nossas próprias histórias e viventes de nossas próprias desventuras, venturas e aventuras.
         Podemos isto sim, partilhar vivências, saberes, medos, conquistas, sonhos, movimentos, mas jamais podemos viver o que os outros vivem. Somente podemos nos aproximar, ver pelos entremeios: podemos nos recusar as visões únicas, perfeitas, monocromáticas e normóticas?
         O que eu escuto, sinto e assimilo é o trânsito do meu sentipensar, é a observação subjetivante que se constrói a partir de minhas inteiras ações no mundo, de minhas interações com os outros. O desafio está em se permear com escutas e olhares mais sensíveis que nos aproximem do coração do outro, da vida do outro, mas que nunca a invada, subjugue ou desencante-a (De La Torre e Moraes, 2004).
O aprender, com todas as suas complexidades e contradições, emerge como expressão de nossas movimentações desejosas de mais e melhor Vida: não se condiciona a tão somente dar conta de conteúdos e currículos prontos, não está apenas situado no cumprir tarefas como imposições que se situam no longínquo dos nossos desejos.
Produzir autorias de pensamento é estar em trânsito pelos espaços de produção de sentidos e significados que podem se presentificar em nossas aproximações com o conhecer. Conhecer que se complexifica à medida que desejo ser criativo, intenso, vivo, capaz, criança, poeta, pesquisador, andarilho, solitário, amigo, companheiro, responsável, motivado e motivador estimulante de outros sujeitos para caminhar por sendas parecidas.
         Se encontro significados e sentidos no que produzo, é o olhar do outro que confirma a abrangência e a validade do que faço, fazendo reconhecer os espaços e tempos do meu próprio fazer, criando e recriando possibilidades de ser sujeito autor de minha trajetória (Beauclair, 2008a e 2008b).
         Nutrimo-nos e nos fertilizamos com este mover-se. Surge, assim, um espaço e um tempo singular onde, como ensinante, sou aprendente e, como aprendente, sou ensinante prezando aberturas de espaços de diálogos, repletos de diferenças e diversidades que fomentam possibilidades de construir, junto aos outros, um aprender prazeroso, participativo, rico e significativo (Beauclair, 2010).
         Este espaço e este tempo, sempre singulares em sua constituição, se configuram como um mover-se pelos tantos fios que compõem a Teia da Vida, numa transição repleta de vivências e experiências onde somos organismos e corpos, sujeitos de subjetividades e objetividades, desejosos de conhecimentos e desejosos de saber: ávidos para aprender mais sobre o situar-se, de modo permanente, frente nossas poucas certezas e nossas muitas dúvidas.
         Nas experiências do viver, atuando no campo do aprender e do ensinar, hoje sei ser essencial vincular a amorosidade e a afetividade, o lúdico e o cantante, o sujeito epistêmico e cognoscente em aproximações com o sujeito dos sonhos, dos desejos que somos todos nós[1].
         Atuando no campo do aprender e do ensinar, nas experiências do viver, sei que somos sujeitos dos desejos dos outros e autores de nossas próprias experiências e vivências, forjadas na contínua história que vamos escrevendo em cada uma de nossas etapas de vida, significadas e ressignificadas em tantas movimentações pelos limites e pelas transgressões.
         Sermos autores de nossas movimentações em todo este processo exige de cada um de nós a compreensão de que somos limitados frente às demandas imensas de tantas outras ações no mundo, mas isso não nos impede de nos dedicar ao encontro com a alegria da autoria, partilhada mesmo em nossas constatações de tantas limitações e impossibilidades (Beauclair, 2009).
         Com a permanente busca pela teoria, ressignificamos o nosso caminhar, lutamos frente aos processos geradores de indiferenças e apatias e seguimos na proposição de construção de novos sentidos para o nosso fazer, o nosso agir e o nosso estar vivo no mundo (Beauclair, 2007).
         São as nossas impossibilidades os motores maiores para este seguir em frente, enredando-nos no pesquisar sobre nossas próprias práticas, criando e recriando modos novos de inventar, intervir e fomentar a autoria, de modo construtivo, relacional e transicional.
         Assim, nos cabe perceber que é nos lugares e tempos onde possuímos algum tipo de inserção que podemos semear possibilidades de compreensão novas sobre algumas de nossas dúvidas, ou sobre muitas de nossas certezas. Nossas dúvidas nutrem o nosso mover-se pelos fios do conhecimento, pelas metáforas presentes na imensa Teia da Vida.
         Investigar é colocar-se em movimento de rever o que já conheço e buscar perspectivas novas para aquilo que desejo conhecer. Investigar é propor-se a caminhar pela procura de novas perguntas para antigas respostas e, ainda, ousar novas respostas para antigas perguntas, num dialético processo de formular movimentações outras, percorrendo sendas diferentes das que nos acostumamos, de um modo bem cotidiano, a percorrer.
         Na compreensão do novo, ou na busca por sua compreensão, podemos avançar de alguns modos. Se os desafios novos se impõem como tal, façamos esforços para intervir de outros modos, exercendo nossas potencialidades de autoria, nos capacitando de modo permanente para irmos além do que nos é dado como verdade. Propormo-nos ao exercício cotidiano da autoria de nossos pensamentos favorece este movimento, impulsiona este avanço: se o pensar pode estar vinculado aos nossos desejos, nossos pensamentos podem fomentar construções novas a partir do que desejamos. [2]

Provocações ao nosso sentipensar: o papel do desejo e do prazer nos movimentos de aprendências e ensinagens.

Autoria não tem a ver com o que já está feito,
não é compreendida como um produto,
mas como uma abertura para o sempre inacabado;
fala mais de um devir,
um modo de situar-se,
uma ética que tem a ver com o
desejo de produzir e com as possibilidades do outro.”[3]

Podemos afirmar que a produção do desejo e do prazer, como propõe a Biologia do Conhecer[4], reside num domínio consensual de ações e isso não significa que estejam ausentes disputas e antagonismos em seu interior. Aprendemos que um domínio consensual vincula-se ao pertencimento a redes de sentidos difusas e heterogêneas, onde a consensualidade só pode acontecer com o retorno, resultado de ações recursivas que, de certo modo, confere possibilidades de estabilidade no meio do caos e da desordem, onde estamos, inevitavelmente, inseridos[5].
Ao ouvir uma sinfonia, se não existisse a junção do caos de sons diferentes, a harmonia seria inexistente. Práticas e exercícios de autorias resultam de domínios consensuais e se tivermos, tão somente, estruturas previamente estabelecidas, acabaremos por desfavorecer os movimentos de aprendências e ensinagens[6].
Tais movimentos são gerados na dialogicidade, tanto no fazer individual quanto no fazer coletivo, na produção de singularidades e no exercício de protagonismos que nutrem a autoria como produção de reconhecimentos e saídas do anonimato.
A autoria de pensamento como exercício de protagonismos, no âmbito das ações de produção de sentidos e significados no agir e fazer em formação contínua implica em movimentos de subjetivação e de identificação, produzindo diferenças, mas destacando-as no que constitui o sujeito autor: o jogo do identificar-se se diferenciando, que constrói e constitui o sujeito autor, que se reconstrói e reconstitui com os outros, propiciadores de reconhecimentos plurais ao serem sujeitos leitores da autoria, vivificados em todo este processo “(...) e ato de produção de sentidos e de reconhecimento de si mesmo como protagonista ou participante de tal produção.” [7]
Toda autoria é exercida em redes de conversações constituintes de si mesmas e dos sujeitos que a produzem: o sujeito autor emerge na produção de sua singularidade, da diferença que produz com o intuito de ser conhecido e reconhecido no âmbito das próprias dinâmicas presentes nas redes que participa, age, interage, vive.
Portanto o exercer a autoria é um movimento de transformação e reconstrução permanente, lugar plástico e maleável entre subjetividade e objetividade[8], no interior das redes de conversações, onde é possível fazer pensável nossa prática e buscar

“(...) um propósito comum de toda construção teórica; todavia, além disso, coincide com o próprio objeto de intervenção psicopedagógica, pois a psicopedagogia tem como propósito abrir espaços objetivos e subjetivos de autoria de pensamento; fazer pensável as situações, o que não é fácil, já que o pensamento não é somente produção cognitiva, mas é um entrelaçamento inteligência-desejo, dramatizado, representado, mostrado e produzido num corpo. Por isso, muito mais importante que os conteúdos pensados é o espaço que possibilita pensável um determinado conteúdo”. [9]

A meu ver, um dos mais importantes papéis do desejo e do prazer nos movimentos deaprendências e ensinagens é o de entrelaçar-se com a inteligência, pois as redes de conversações sempre acontecem e se constituem ao longo de nossos ciclos vitais, nas diferentes fases de nossas existências como sujeitos de aprendizagens múltiplas.  Tais redes nem sempre são analisadas e sentipensadas como possibilidades de exercícios de autoria de pensamento que sejam significativas para todos os que delas participem: vital é mesclar individualidades, autorias pessoais, autorias coletivas, ignorâncias, conhecimentos de si mesmos e dos outros no reconhecer-se no que foi produzido, nas “obras criadas” como registros de aprendências e ensinagens. [10]
Nos processos de compreender a importância do resgate do desejo de aprender e do prazer em ensinar na formação continuada de educadores e inicial em Psicopedagogia, venho apostando na autoria de pensamento como uma maneira de ver e viver, olhar e sentipensar a prática educativa que fomente momentos experienciais e vivenciais no espaço e tempo da sala de aula, onde seja possível o resgate das alegrias de cantar, brincar, vivenciar dinâmicas de grupo, trabalhar com as dimensões da arte, do recorte, da colagem, do jogo, do corpo em movimento, da dança, enfim, uma sistêmica didática interativa e propositiva que propicie maneiras de favorecer o linguajar (Maturana, 1997).
Para Maturana (1997), os sentidos estão na dinâmica relacional que existem e dependem da interioridade corporal, onde nossos pensares emergem em redes de conversações e coordenações de coordenações consensuais geradoras de ações com significados e sentidos nas emoções e nas condutas de cada um de nós. Ao convivermos com domínios relacionais diferentes, expressamos diferenciados domínios de nossas relações e isso nos permite produzir sentidos diferenciados, ao vivermos em distintos espaços e tempos de aprender e ensinar.
Espaços e tempos de aprender e ensinar em exercício de coexistência com o processo de linguajar, força motriz da dinâmica relacional que produz: indagações, saberes, ideais e ideias, reflexões e produção de sentido existencial.  É no conversar, compreendido aqui como versar com o outro, que podemos elaborar coordenações de coordenações consensuais de ações, reações e novas ações, num movimento recursivo, complexo e favorecedor de práticas educativas onde possamos perseguir a completude daautopoiese[11].
Assim, a autoria de pensamento real e efetiva é semeada, cuidada, germinada e nutrida quando é produzida no espaço do diferencial, em meio às complexas redes de significados e sentidos que estamos inseridos, mas nem sempre contextualizados [12].
A autoria de pensamento real e efetiva emerge quando nos retiramos do lugar comum e nos propomos:
·         A perguntar;
·         Ao posicionar-se frente ao desconhecido;
·         A sermos capazes do estranhamento;
·         A questionar a realidade dada;
·         A refletir sobre os sentidos e significados do diálogo e do conversar;
·         Ao encontro com a diversidade e com a diferença;
·         Aos processos de novas percepções sobre continuidades, descontinuidades e rupturas;
·         A compreender as diferenças entre identidade e semelhança, alteridade e igualdade.
·         E talvez, mais difícil e por isso mesmo, não menos importante: o estabelecer autorias coletivas de pensamento, que repercutam modos de pensar individuais que se apóiem em movimentos coletivos, representantes de grupos, por exemplo;

Na tessitura das ideias até aqui expostas, é interessante destacar a necessidade de termos presente, nos espaços e tempos do ensinar e do aprender com produção de sentido, a alegria do encontro com a autoria, como nos ensina Fernández [13], pois tal alegria manifesta-se no linguajar como domínios de relações onde participamos como sujeitos autores, constituídos em contingências próprias, expressivas, marcadas por singularidades e pelas interações com os outros, consigo mesmos, com o mundo.
Será com o autorizar-se a ver sentido em nossos próprios percursos comoaprendentensinantes que ampliaremos nossas relações com outros sujeitos e grupos com os quais estabelecemos possibilidades de convivências, do estarjuntocom, intervindo, acompanhando, participando, organizando, anotando, desenvolvendo observações, participando.
A alegria do encontro com a autoria propicia novas maneiras de elaborarmos modos diferentes de navegação com as tantas possibilidades que ocorrem nos encontros com os outros, no intercambio de ideias através da fala e do registro, do diálogo e da reflexão, da ação por si mesma e da ação pensada, do levantamento de hipóteses, da atividade grupal, da reflexão coletiva, da produção individual, das construções singulares de estratégias comunicativas, transcendendo conhecimentos postos e desmistificando perspectivas reducionistas.
Neste sentido, o trabalho que venho realizando com grupos de formação, ao longo do tempo, me possibilita mapear registros do que utilizo como estratégia principal de intervenção e, hoje, penso mais em observar os lugares, os diferentes ritmos e tempos, as mudanças possíveis nas interações, do que buscar, em vão, abranger a totalidade dos processos vividos, pois também acredito ser possível “desmontar solenidades territoriais para ir germinando autorias: essa é a alegria que cresce nos grupos”.[14]
Nas práticas da docência em Educação e Psicopedagogia, a busca maior tem sido a de colaborar para a criação de redes de conversações capazes de promover o fazer emergir novas autorias, através de exercícios de escritas e tessituras criativas, através de oficinas de produção textual, com os “diários de bordo como registros de aprendências”, realizados sempre que é possível em redes interativas que se constituem no intercâmbio mesmo do que se produziu ao longo dos períodos de realização dos cursos de formação. São marcas que foram se acoplando a própria prática, configurando alguns sentidos identitários de uma metodologia proativa que cultiva diferentes estilos e propõe a reafirmação do sentido de pertença ao vivido nos domínios consensuais[15].
Os “diários de bordo como registros de aprendências” [16] servem como referenciais para outras produções seguintes, num repositório de estilos e memórias do vivido, constituindo-se como arquivos subjetivos e intersubjetivos, com colagens, texturas, textos, imagens, bordados, manifestações plurais abertas em redes interativas de auto e hetero-formação que conserva o próprio histórico do como foi produzido, com a incorporação e a difusão de formas e estilos diferenciados. Assim sendo, acaba por ser um modo de seguir motivando novos exercícios de autoria, para capacitar e motivar novas tessituras e feituras em Educação e Psicopedagogia, produzindo novas reflexões sobre o importante papel do professor em nosso tempo[17].

Aprender e ensinar, ensinar e aprender: a ênfase na motivação, o professor e seu papel importante papel.

"Se os professores modificam sua atitude,
 os alunos conseguem aprender. 
Um professor é alguém que acredita que 
seus alunos podem aprender.”
Alicia Fernández

Será que ainda teremos muito que continuar a enfatizar sobre a importância da motivação no trabalho do professores? É muito interessante ressaltar que professores, mesmo que estejam sob mesmas condições (de escolas, formação e salários), apresentam uma diferenciação interessante: alguns não conseguem realizar um bom trabalho, atrair os seus alunos, despertar o desejo de aprender, enquanto outros fazem isso com maestria.
O que gera motivação para que alguns realizem suas ações com alegria e amorosidade e outros não? Sabemos da inexistência de um paradigma único de percepção sobre esta realidade, mas não podemos esquecer que alguns fatores interferem neste processo, de modo contundente. Aspectos gerais tais como: capacidade de persuasão, habilidades sócio-comunicacionais, características de personalidade empática, carisma, competências em facilitar relações interpessoais, capacidade de fomentar diálogos abertos e criativos, habilidades de gerenciamento de conflitos, enfim, fatores determinantes sobremaneira para que nossas intervenções sejam bem sucedidas, pois interferem em nossas potencialidades de relação e de comunicação motivadora.
Se, como professores, deixarmos de ser sujeitos que apenas lecionam e passarmos a serinterventores que buscam articular conhecimentos que possuam significados e sentidos paraaprendentes e ensinantes em processos de interação efetiva (e afetiva), teremos mobilizações cognitivas que fazem emergir capacidades sinérgicas favorecedores de sintonias interpessoais altamente nutridoras de nossas aprendências e ensinagens.[18]
Comunicação motivadora é um desafio permanente ao desenvolvimento de nossas práticas interativas, que favorece o trabalho pedagógico, a meu ver, sempre uma intervenção psicossocioeducativa. Sabemos que uma das melhores maneiras de conseguirmos o estabelecimento de vínculos positivos está em demonstrar que, além de interessarmo-nos verdadeiramente pelos nossos campos de ações e pesquisas, principalmente nos objetivamos a adentrarmos com afetividade no mundo e nos interesses dos nossos alunos,educandosaprendentes, como queiramos chamar aqui aqueles que participam de nossas intervenções.
Intervenções psicossocioeducativas no campo da docência e das ações educativas serão bem sucedidas quando preparadas não para o fracasso, mas sim para o sucesso. Se buscarmos estar preparados para o desenvolvimento de relações onde a afetividade esteja presente, serão criadas predisposições para atitudes positivas frente ao trabalho a ser exercido, pois todos nós captamos, de modos conscientes e inconscientes, a confiabilidade, a mansidão, a doçura, a afabilidade, a maleabilidade  que, a partir de todas as minhas práticas de intervenção, posso afirmar serem geradoras de expectativas positivas e otimistas frente ao desafio de conectar aprendizagem com ensinagem.[19]
Aprender é ensinar, ensinar é aprender.
Ao aprender e ensinar somos mundos que se conectam: o eu e o outro na busca do conhecer, do saber, do saber fazer, do ser fazer saber, do saber fazer-se SER. Como ensinantes e aprendentes, somos o sal da terra, a luz do mundo, o fermento na massa, pois agirmos em prol da evolução de todos. Sermos generosos neste movimento é propiciar a alegria do exercício coletivo e pleno da autoria de pensamento, da autonomia do sujeito humano, vivendo as aventuras e desventuras de interagir no movimento do mundo, complexo por excelência.
Cada sujeito aprendente e ensinante é um mundo particular, repleto de suas vivências, que vão muito além de tão somente ser seres da cognição. Somos emoção e vida, morte e essência, somos fruto de um tempo, resultado de nosso caminhar humano de evolução. A construção/reconstrução de uma nova “civilização”, onde a afetividade seja repleta de amorosidade, nos convoca a pensar num outro mundo possível, onde a teia da vida (re)signifique práticas, fomente o desejo de mais e melhor vida, nos tempos e espaços de nossas intervenções, sempre compreendidas como uma (re)invenção cotidiana de viver e estar junto com os outros, sempre diversos de nós mesmos.
Aprendizagem/ensinagem são processos de co-autoria, de co-participação: se aprende com alguém que ensina, se ensina quando alguém aprende. Uma nova sociedade, de fato aprendente, compreende o ser em sua inteireza, percebe que somos irmanados no sentido pleno desta palavravida: percebe as palavras como essência de mundo, essência do existir.
Nossa constituição como sujeitos é resultante de todo este processo e será possível outro tempo somente se buscarmos a renovação diária de nossas ações e condutas e se percebemos o mundo como uma grande possibilidade de encontro humano. É no espaço e no tempo do aprenderensinar que podemos encontrar significados e sentidos para nossas existências e urge (re)configurar modelos, rever atos e fatos, criar novas metodologias, mais ativas e participativas, onde o intercâmbio de saberes e ignorâncias possibilite a (re)criaçãode um novo ser humano, que se perceba como um sujeito desejante do (re)encontrar-seconsigo mesmo, elaborando a assunção amorosa de nossas tantas limitações, de nossas potencialidades e possibilidades, de nossos dons pessoais.
Aprender e ensinar é (re)encontrar-se com outros sujeitos também desejantes, reconhecendo em todos e em cada um o seu próximo, o seu semelhante, um irmão, um amigo, um co-autor de sua subjetividade, de sua história e lenda pessoal. Aprender e ensinar é(re)encontrar-se com nossa humana natureza, nem sempre em nós presente de forma consciente, mas que é sempre fomentadora de novos vínculos entre o eu e outro, entre o outro e o mundo, entre os diferentes eus e os outros, que juntos interagem como viventes na imensa comunidade humana que nos constitui.
Aprenderensinar é sabermos de nosso passado, é vislumbrarmos um futuro, mas essencialmente é nos percebermos como uma grande possibilidade de fazermos, cada um de nós, a nossa parte, nos imensos desafios do nosso tempo presente: por isso, devemos desejar, agir e buscar elaborar nossos processos e ações como ensinantes, eternos aprendentes, aprendentes eternos ensinantes de nosso tempo presente, acreditando, vinculando, pesquisando, aliando teoria e prática, reconstruindo, promovendo a autoria de pensamento, educando pela pergunta, pela aprendizagem significativa, pela emancipação humana. Caminhos do coração. Estradas da emoção, pontes do afeto. [20]

Criação de vínculosafeto e amorosidade: desafio permanente em utópicos caminhos?

“(...) Para tanto, trabalho a fazer não falta, para tanto , lutas e batalhas a travar também não. Mas é preciso renovar nossas forças, lançar novos vôos, caminhar desejando que a alegria de ensinar e educar contagia nossas vidas e supere nossos cansaços de tantas injustiças, exclusões e infelicidade. Ensinar é acreditar." [21]

Justificando alguns aspectos e aproximando ideias como discussão sobre a criação de vínculos, afeto e amorosidade como um desafio permanente em utópicos caminhos, acredito que é preciso, cada vez mais, darmos ênfase ao sentido maior da palavra crise, transmutada em oportunidade: vivemos, todos nós, num mundo diferente do que existia há dez anos, visto que as mudanças presentes nos processos comunicacionais afetaram nossos modos de agir, fazer, aprender, ensinar, viver.
A sociedade atual se apresenta em transformações profundas e cotidianas, mediante a complexidade e a dimensão planetária dos nossos problemas. Portanto, exige de cada um de nós ao menos uma necessária e permanente conduta: aprender sempre, de modo constante, em todas as situações que vivenciamos em nossas vidas pessoais, nas interações com os outros, em nossos ofícios e instituições.
Aqui reside outro ponto de partida às nossas reflexões: as contribuições da Psicopedagogia em todo este contexto, convocando-nos à construção de relações mais verdadeiras, pautadas na diferença e na pluralidade, na alegria e na motivação e, claro, na ativa participação de todos no processo de criar sentidos e significados para uma nova vida, mais plena e digna para todos.
De modo muito biográfico, sinto e penso que a Psicopedagogia favorece novos pontos de partida aos sujeitos em movimentos por suas aprendizagens e autorias. Nas múltiplas experiências com formação de ensinantes e profissionais psicopedagogos ao longo dos últimos anos, tenho feito inúmeras reflexões a respeito das contribuições da Psicopedagogia no contexto citado acima. O que tenho observado e vivenciado, vivido com a intensidade de produzir novos significados e sentidos ao meu próprio caminhar, ao meu agirfazer?
A Psicopedagogia, quando compreendida como uma EAM (Experiência de Aprendizagem Mediada), acaba por nos convocar à construção de relações mais verdadeiras. Com esse movimento elaboramos e reelaboramos significados às nossas trajetórias como aprendentesensinantes e, com isso, seguimos na busca de organização de informações e de conhecimentos, nos conduzindo para melhores momentos de sabedoria nas tomadas de decisão em nossas vidas. No entanto, isso não significa afirmar que a Psicopedagogia é a salvação de todas as nossas mazelas, que é a redenção de nossas tantas limitações.
Ao contrário, com a Psicopedagogia estabelecemos novos olhares para os distintos modos como operamos a condução de nossas histórias de vida, além de validarmos outros momentos de nossas próprias biografias: por isso o uso da afirmativa “a possibilidade do (re)encontro”.
Tempolinguagemtrabalhopesquisaescutaolhar e registro: sete movimentos essenciais ao desenvolvimento da autoria de pensamento, processo psicopedagógico essencial à formação e assunção da Psicopedagogia como modo de ser e estar sempre aprendensinanteem conjugação ativa e (des)organizada, que vincula nossas vidas nas dimensões:
• Do Cuidado;
• Do Intercâmbio;
• Da Amorosidade;
• Da Construção Coletiva;
• Do Fomento Ativo à Autoria;
• Da Continuada Formação;
• Da Pesquisa como Processo Permanente.

Penso e sinto interesse imenso em propor pesquisas, em trabalhos futuros, sobre a aliança entre os sete movimentos essenciais ao desenvolvimento da autoria de pensamento com as dimensões acima expressas, ampliando relações e reflexões ao criar um conjunto de idéias que entrelacem Tempo e Cuidado, Linguagem e Intercâmbio, Trabalho e Amorosidade, Pesquisa e Construção Coletiva, Escuta e Fomento Ativo à Autoria, Olhar e Continuada Formação, Pesquisa como Processo Permanente e Registro, numa possível contribuição às nossas compreensões sobre os novos modos de ser e estar nas escolas, nas famílias e nas instituições.

Conclusão: Ideias para se discutir, pontos de vista para se partilhar em aberturas para diálogos e interações.

Somos sujeitos desejantes e por isso sujeitos aprendentes. Onde reside o desejo, há permanente busca por novas aprendizagens e este processo é ininterrupto. Vivemos numa sociedade que faz com que o desejo de aprender seja foco e desafio, pois só há mudança efetiva na complexidade da realidade quando comportamentos e pensamentos são alterados, transformados.
Não podemos nos manter em posição de paralisia: é vital o mover-se na propositura da continuidade de nossas formações. É desafio perene o seguir adiante, mesmo com as adversidades que são geradas pela falta de condições mais adequadas ao nosso viver.
É importante fazer uso do que se tem disponível, ampliar competências, habilidades e, principalmente, construir novos saberes, reforçando sempre que em nossas incompletudes está situado o acreditar nas potencialidades humanas de superação das dificuldades que nos são apresentadas.
Quem atua em Educação e em formação continuada, se observa, em muitos momentos, vivenciando ciclos que se alternam entre o desejo de seguir em frente e a vontade de desistir, principalmente frente ao descaso que acabamos muitas vezes ver presentes na realidade cotidiana nos espaços e tempos de nossas ações, de nossos fazeres.
Vital, em todo este processo, é rever caminhos, percursos e trajetórias e verificar, com tal revisão, aspectos que podem favorecer nosso ressignificar, nosso caminhar com positividade utópica, pois jamais teremos a capacidade de estarmos plenos e satisfeitos, pois ao atingirmos determinados objetivos ou alcançarmos algumas de nossas metas, cada um de nós terá outras posições para alcançar, outras tarefas para cumprir, outros desejos para realizar num eterno recomeçar.
Propondo-me a recomendação de Josso (2010), busco permanecer em meus exercícios de autoria de pensamento, no desejo de aprender e no prazer de ensinar, para seguir fazendo que cada um de meus aprendentes possa: “(...) aceitar a experiência de que sua formação é uma pesquisa em si e que a pesquisa na qual ele se envolve lhe permitirá clarear e até mesmo transformar seu projeto de formação.” [22]
As ideias aqui expostas se nutrem por tais questões e o desejo maior, efetivamente, é o de sequenciar em processos de discussão, propondo-se a intercambiar diferentes pontos de vista partilhados em novas aberturas para diálogos e interações. Se seguirmos adiante acreditando que o objetivo maior da Educação é a geração da felicidade, importante sempre é o recomeçar, como nos alerta Demo (2002):

A felicidade tem a lógica e a consistência da flor: não há como separar sua beleza da fragilidade e do fenecimento. O fenecimento não é apenas a destruição da beleza, mas condição de recomeço.[23]

Recomecemos, então.

Notas:
BEAUCLAIR, João. Pedagogia da Amorosidade como Estratégia Interdisciplinar de Intervenção Psicossocioeducativa na Educação para a Paz. Projeto final para obtenção do DEA Diploma de Estudios Avanzados em Intervención Psicosocioeducativa. Universidade de Vigo, Faculdade de Ciências da Educação, Campus de Ourense, Galícia, Espanha, 2010.
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[1] BEAUCLAIR, João. Pedagogia da Amorosidade como Estratégia Interdisciplinar de Intervenção Psicossocioeducativa na Educação para a Paz. Projeto Final para obtenção do DEA Diploma de Estudios Avanzados em Intervención Psicosocioeducativa. Universidade de Vigo, Faculdade de Ciências da Educação, Campus de Ourense, Galícia, Espanha, setembro de 2010.
[2] BEAUCLAIR, João. Um pouco mais de desejo, de autoria, de pensamento: uma saída de emergência? Publicado em 28/10/2010 e Disponível emhttp://www.psicopedagogia.com.br/new1_artigo.asp?entrID=1297
[3] SORDI, Regina Orgler. Os materiais da autoria. Revista E.Psi.B.A. Psicopedagogía. Buenos Aires, Argentina, número 11, 2004, p 80.
[4] MATURANA, Humberto R. e VARELA, Francisco G. A árvore do conhecimento: As bases biológicas do entendimento humano. Campinas: Editorial Psy II, 1995.
[5] MATURANA, Humberto e VERDEN-ZÖLLER, Gerda. Amor y Juego: fundamentos olvidados de lo humano – desde el Patriarcado a la Democracia 5. ed. Santiado de Chile: Editorial Instituto de Terapia Cognitiva, 1997.
[6]BEAUCLAIR, João. Autoria de pensamento, aprendências e ensinagens: novos modelos e desafios na produção de conhecimento em Psicopedagogia. Disponível emhttp://www.abpp.com.br/artigos/34.htm 
[7] FERNANDÉZ, Alicia. O saber em jogo: a Psicopedagogia propiciando autorias de pensamento. Porto Alegre, Editora Artmed, 2001, p. 90.
[8] PAÍN, Sara. Subjetividade e objetividade. Relação entre desejo e conhecimento. São Paulo: CEVEC, 1996.
[9] FERNANDÉZ, Alicia. O saber em jogo: a Psicopedagogia propiciando autorias de pensamento. Porto Alegre, Editora Artmed, 2001, p. 55.
[10] BEAUCLAIR, João. Aprendizagem significativa e construção de Diários de Bordo: configurando registros na práxis de formação em Psicopedagogia. Revista Científica da FAI, volume 5, número 1, Santa Rita do Sapucaí, MG, 2005.
[11] BEAUCLAIR, João. Neuropsicologia e Biociências: Aprendendo Ecologia Humana com um novo olhar - sobre si mesmo e os outros- a partir da Autopoiese. In: CAPOVILLA, Fernando César e RIBEIRO DO VALLE, Luiza Helena. Temas Multidisciplinares de Neuropsicologia e Aprendizagem. Tecmedd, Ribeirão Preto, 2004.
[12] Maturana, Humberto. Emociones y Lenguaje en Educacion y Politica. 9. ed. Santiago de Chile: Dolmen Ediciones, 1997.
[13] FERNANDÉZ, Alicia. O saber em jogo: a Psicopedagogia propiciando autorias de pensamento. Porto Alegre, Editora Artmed, 2001, páginas 122, 123, 124, 125 e 126.
[14] Idem. Página 124.
[15] BEAUCLAIR, João. Interdisciplinaridade, Auto(Eco)Formação e Histórias de Vida: Proposições Reflexivas, a partir da Autoria de Pensamento, na Formação de Professores num Mundo em Crise. III Congresso Internacional Diálogos sobre Diálogos, Faculdade de Educação da UFF - Campus do Gragoatá, Niterói, 2010.
[16] BEAUCLAIR, João. Aprendizagem significativa e construção de Diários de Bordo: configurando registros na práxis de formação em Psicopedagogia. Revista Científica da FAI, volume 5, número 1, Santa Rita do Sapucaí, Minas Gerais, 2005.
[17] BEAUCLAIR, João. Educação & Psicopedagogia: aprender e ensinar nos movimentos de autoria. Pulso Editorial, São José dos Campos, São Paulo, 2007.
[18] BEAUCLAIR, João e CARVALHO, Seilla. Sinergia: aprender e ensinar na magia da vida (uma introdução. http://www.abpp.com.br/artigos/105.htm Publicado em outubro de 2009.
[19] BEAUCLAIR, João. Do fracasso escolar ao sucesso na aprendizagem. Editora WAK, Rio de Janeiro, 2008.
[20] BEAUCLAIR, João. Aprender é ensinar, ensinar é aprender. In: Caminhos da Psicopedagogia: o referencial da ABPp no Sul de Minas. Informativo do Núcleo Sul Mineiro da Associação Brasileira de Psicopedagogia, Varginha, Julho de 2008. 
[21]  BEAUCLAIR, João. Ensinar é Acreditar, Coleção Ensinantes do Presente, Volume I. WAK Editora, Rio de Janeiro, 2008, p. 23.
[22]JOSSO, Marie-Christine. Caminhar para si. Tradução Albino Pozzer. Coordenação Maria Helena Menna Barreto Abrahão. EDIPUCRS, Porto Alegre, 2010, p. 251.
[23] DEMO, Pedro. Combate à pobreza: desenvolvimento como oportunidade.Campinas: Autores Associados, 2002, p. 53.
Joao Beauclair